ARTIGOS

Publicado em 05/05/2020

Análise da demanda de autoveículos no pós-crise

O que muda no planejamento automotivo

Qualquer executivo do mercado automobilístico tinha uma boa visão sobre qual veículo os brasileiros adoravam comprar, quais os volumes, opcionais e a segmentação da indústria antes da COVID-19. Porém, essa pandemia deixou impressões muito fortes em toda a população e, certamente, terá influência nas escolhas dos clientes daqui para frente. O ambiente industrial também mudou, com maior cotação do dólar, maiores dificuldades logísticas, menor liquidez e fábricas mais ociosas, o que força um aumento generalizado de preços.

Os clientes

Começando pelo cliente, o que ele vai comprar? Será que continuará comprando no mesmo ritmo de antes? Sociólogos e antropólogos falam de uma nova era, na qual as pessoas ficarão mais isoladas, viajarão menos, porém estarão mais conectadas virtualmente. Engajamento virtual não usa meio físico de transporte além do serviço de entrega! 

Uma segunda razão para a retração na indústria é a temporária descapitalização das famílias em virtude do isolamento, restrição ao trabalho e redução de salários. Uma terceira razão, por sua vez, é o aumento de custos devido ao dólar mais caro em carros com grande conteúdo importado, processos logísticos mais complexos e fábricas produzindo menos. Também contribui a megatendência de desinvestimento em um bem caro, o automóvel, com o uso crescente de transporte público, compartilhado e on-demand. Do lado positivo da demanda, apenas a possibilidade de proteção melhor contra o vírus no carro particular. 

Passando a régua, nos próximos dois anos, a indústria deverá crescer menos do que foi projetado antes da pandemia, com 2020 fechando em 2,15 milhões de unidades ante os 2,66 milhões de 2019, uma redução de 17%. Alguma recuperação se observa para 2021, com 2,41 milhões de unidades, ou seja, uma recuperação de 12% já no primeiro ano pós-crise. É uma situação ruim, mas não o desastre total previsto por alguns pessimistas. Nossa frota corresponde a 0,2 veículos por habitante, o que é pouco em termos globais ou comparado com a Argentina que tem o dobro. 

Os veículos

E quais veículos esse cliente irá buscar? A necessidade de proteção já era um fator forte na escolha de SUVs e essa razão de compra fica mais forte quando o cliente fica vulnerável. O SUV é mais robusto, permite melhor visão dos outros veículos, suporta melhor os terrenos difíceis e acomoda confortavelmente toda a família. Com as restrições de orçamento já citadas, terão lugar os SUVs de bom tamanho e mais acessíveis. O tamanho é importante porque, com a redução da demanda, os clientes optarão por um veículo que atenda a todas as necessidades da família. Na busca por produtos mais acessíveis, sairão ganhando aqueles que conseguirem segurar preços ante a escalada do dólar, seja por redução de margem, “decontenting” ou localização de conteúdo importado. Os clientes pensarão mais antes de aplicar seus recursos em um automóvel, quando mais opções de compartilhamento estiverem disponíveis. O mix de SUV, que terminou 2019 em 22%, certamente ultrapassará 25% em 2020 e 27% em 2021.

Os veículos compactos, hatches e sedans, continuam com a liderança da indústria, por restrições de orçamento. O mix de motores 1.0 irá aumentar, tanto pela eficiência e potência alcançada por esses mecanismos, como pela vantagem fiscal. Novamente, veículos com os equipamentos certos e preços acessíveis estarão na ordem do dia, o que não significa veículos “pelados”. Equipamentos como ar condicionado, direção assistida ou multimídia nunca mais deixarão de estar presentes nos veículos e serão mais voltados à prestação de mobilidade do que à demonstração de personalidade de seu proprietário. Os pequenos e compactos, que já foram 65% das vendas no Brasil, são hoje 54% (42% hatches e 12% sedans) e deverão manter essa fatia do mercado até o fim de 2021. Aumenta o peso de veículos pequenos nesse segmento, com design simplificado, dimensões reduzidas e capacidade para quatro pessoas. Perdem os sedans médios, tanto pela migração para os SUVs quanto pelo “downgrading” para compactos bem equipados. Picapes e furgões permanecem com a mesma fatia de hoje.

O combustível

A queda brutal dos preços do petróleo deve se refletir nas bombas brasileiras e tornar mais difícil a transição para os elétricos. Importados, caros, sem infraestrutura e com recursos governamentais orientados para outras necessidades, o segmento de elétricos no Brasil continuará apenas com frotas de demonstração e ativistas mais engajados. Veículos híbridos continuam mais viáveis, embora sofram das mesmas dificuldades com o dólar alto. Digamos que os planos e os volumes sofrerão um atraso superior a dois anos, quando comparados com as informações antes da crise. A curto e médio prazos, a eletromobilidade estará mais presente no transporte urbano de massa do que no transporte individual. 

A venda de veículos

E de que forma os veículos serão vendidos? Para quem? Neste momento, com zero turismo, isolamento social e restrição de circulação, as locadoras têm seus pátios abarrotados de veículos devolvidos e preparam grandes operações de venda de usados para fazer caixa, impactando diretamente os seus preços no mercado. Em um segundo momento, com a ativação da economia, deverão voltar os serviços de mobilidade on-demand e compartilhados. De qualquer forma, a parcela das locadoras nas vendas deste ano deverá diminuir.

A se julgar pelos números de abril, as vendas de veículos PCD (portadores de deficiência) foram as menos atingidas pela crise, passando a 2/3 das vendas de alguns modelos. Só o futuro dirá se isto é uma demanda reprimida em atendimento ou uma parcela que ainda tem preservadas suas necessidades particulares de locomoção.

Gestão de leads, atendimento virtual, serviços domiciliares, vendas on-line sairão da fase de gestação e passarão a significar o maior volume dos negócios dos concessionários que já se preparam para os novos tempos – pelo menos aqueles que sobreviverem.

Em resumo

Demanda restrita pela receita das famílias, preços mais altos devido ao repasse do dólar alto, mix empobrecido, embora respeitando o desejo por SUV e equipamentos mais desejados, petróleo mais barato, atraso nos elétricos individuais, fortalecimento da mobilidade on-demand, incluindo o transporte público e gestão virtual das vendas. Estes conceitos estarão no cotidiano dos executivos do setor durante os próximos meses e a grande maioria das decisões serão impactadas por estas mudanças.

Cassio Pagliarini
Bright Consulting

 

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