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Publicado em 28/04/2020

Impacto do isolamento social na distribuição de veículos

Com o isolamento social decretado em grande parte dos estados e com o natural declínio do interesse de compra de automóveis neste momento, as redes de distribuição de veículos passam por desafios nunca imaginados e para os quais não estão preparadas.

Uma concessionária tem 80-85% do seu faturamento ligado à venda de veículos novos e usados, com uma rentabilidade marginal baixa, de 2 a 5%. Veículos são bens valiosos e, dependendo da marca e modelo, as margens brutas de comercialização são de 7 a 10%. A rentabilidade marginal é calculada subtraindo-se da margem bruta todos os custos diretamente ligados à venda, como comissões de vendedores e gerentes e custos de estoque. Aqui também entram os brindes e descontos oferecidos aos clientes e as bonificações e incentivos pagos pela montadora. É uma conta muito apertada, na qual o concessionário não tem espaço de manobra: só consegue dar descontos significativos se tiver o suporte da montadora.

Os 15-20% restantes do faturamento vêm de operações de assistência técnica e venda de peças, com melhor rentabilidade – em torno de 20-25%. Sobre o resultado geral de venda de veículos e de assistência técnica, se aplicam ainda os custos administrativos, da ordem de 3 a 6% do faturamento total (custos maiores para empresas menores). É aqui que aparecem as despesas administrativas como salários, aluguéis, seguros, manutenção, publicidade, treinamento, alguns tipos de inventário, entre outras. Com esses números, verifica-se que o concessionário vive “na casquinha”. Quando a marca está em bom momento e o produto é bem aceito, a lucratividade aparece. Quando as vendas são escassas e o cliente precisa ser convencido a comprar o produto, o concessionário perde dinheiro. E pode perder muito dinheiro se não estancar imediatamente a sangria.

E o que aconteceu com a pandemia do coronavírus? Sumiram os clientes, mas os custos ficaram. Números aproximados avaliam em 70% a redução nas vendas de veículos e 50% na assistência técnica e peças – carros que andam pouco se acidentam pouco e quebram menos.

Quais os grandes custos de uma concessionária? 

Em primeiro lugar, os custos de inventário, tanto de veículos quanto de peças. As montadoras subsidiam os primeiros 25 dias (algumas de 45 a 60 dias, de acordo com marcas e modelos) de estoque sem cobrança de juros para que os concessionários possam vender os produtos nesse intervalo. Com a parada das vendas, as montadoras devem ampliar essa franquia de dias livres de juros ou subsidiá-los para que o concessionário não fique insolvente na retomada dos negócios. O mesmo raciocínio vale para peças. Porém nem todas as montadoras agem com a mesma velocidade e intensidade. Pedir ajuda aos bancos só implica em tornar a dívida maior, afinal banco é banco e a responsabilidade de manter sua rede viva é da montadora, não do banco. Também negociam as postergações ou reduções de seus pagamentos: aluguéis, fornecedores, mídia, empréstimos.

Para as redes que têm alguma forma de capitalização – um fundo formado em conjunto pela montadora e concessionário para financiamento do estoque de atacado – existe a possibilidade de liberar uma parte do capital formado pelos concessionários para servir como capital de giro. 

Concessionárias têm equipes grandes para lidar com todas as suas operações. Parte dela é remunerada de forma variável, com comissão sobre as vendas de veículos, de serviços e de peças. Se a venda não acontece, a concessionária fica sem capital de giro e os funcionários sem remuneração – uma situação grave, que implica na necessidade de muita flexibilidade de ambas as partes. O governo aceitou o deferimento de taxas e impostos ainda não pagos, inclusive impostos incidentes na folha de pagamento. Prosseguem as negociações para redução de jornada e salário, em um momento em que o mais importante é a manutenção do emprego, algo que nem todos conseguirão, pois a retomada dos negócios vai demorar e virá lentamente. 

Para o tratamento de clientes, as redes buscam formas alternativas de operar, com maior presença virtual onde isso é possível – não dá para fazer manutenção num veículo de forma virtual, mas é possível contatar clientes por telemarketing e sites, gerando leads. Ações comerciais com deferimento de prestações para dias melhores também têm gerado interesse entre os clientes. Com o substancial aumento do dólar, os preços dos veículos não irão recuar. 

Os concessionários farão, também, grandes ofertas de veículos usados na volta do lockdown, para fazer capital de giro e pagar as despesas de operação. E as locadoras terão que desovar enorme quantidade de estoque no varejo de usados, o que pressionará os preços para baixo. 

A distribuição de veículos sairá desta crise muito diferente do que entrou. Os concessionários menos capitalizados correrão risco extremo de extinção se não administrarem seus recursos de maneira draconiana. As vendas e agendamentos por internet devem aumentar sua participação nos negócios. Montadoras menos ágeis perderão concessionárias e clientes. Contratos de trabalho serão diferentes. Talvez até a relação do cliente com seu veículo mude agora de forma mais incisiva, na direção do uso compartilhado e não da propriedade, já que o patrimônio parado durante a pandemia não serviu para quase nada. Os avanços na mobilidade são válidos ainda mais nesse novo tempo, o que significa que as megatendências para veículos compartilhados, mobilidade on-demand e automóveis conectados só tendem a aumentar.

Cassio Pagliarini
Bright Consulting

 

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