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A nova ordem do setor automotivo pós Covid-19

Publicado em 27/10/2020

Os ensinamentos da engenharia de tráfego

Como uma restrição à liberdade pode ser benéfica à sociedade

A engenharia de tráfego completa noventa anos em 2020. Institucionalizada nos Estados Unidos com a criação do Institute of Traffic Engineers, foi fundamental para suprir as necessidades no crescimento da frota de veículos americana e, posteriormente, no mundo. O automóvel transformaria nossos hábitos, nossas cidades e a sociedade após a Segunda Guerra mundial.

O controle semafórico, como ainda o temos, foi primeiro dispositivo de interação entre os automóveis e a via. O semáforo passou a ser usado em 1914, no estado americano de Ohio, no que chamamos de pré- Intelligent Transport Systems (ITS). Os primeiros relatos de semáforos são da Inglaterra no século XIX, em virtude das passagens das vias em linhas férreas, mas foram descontinuados após um grave acidente os operadores.

Dentre vários estudos como o Highway Capacity Manual (HCM), o Modelo Linear de Greenshields e a Teoria de Webster, desenvolvidos por estudiosos do tráfego automobilístico, nascem também os pilares da engenharia de tráfego, conhecidos na língua inglesa como 3E: Engineering, Education e Enforcement; que por tradução livre, seria: engenharia, educação e fiscalização, formando uma tríade.

Os pilares desta tríade devem se equilibrar nas ações relacionadas às implantações e interações entre as vias, pessoas e os automóveis. Um exemplo claro está na operacionalização de uma faixa de pedestre em um cruzamento com controle semafórico. Se não há uma orientação de que, a partir de agora, os pedestres devem atravessar caminhando pela faixa e os motoristas devem respeitá-la durante todo o seu ciclo, todo o trabalho de engenharia será em vão.

O último pilar, a fiscalização, é o fechamento de todas estas ações para que o pedestre possa conhecer seus direitos e deveres pelo pilar educação, cumprindo a travessia pela faixa. Se houver alguma discordância no ponto de conflito e desrespeito no pilar educação, uma advertência verbal pelos agentes de mobilidade urbana, que se estende ao pilar educação, é uma alternativa. Exauridas todas as possibilidades, a fiscalização pode ainda aplicar uma multa.

Um caso curioso ocorreu no século passado no Japão: o cumprimento das leis de trânsito chegou a um nível em que as infrações tendiam a zero, fazendo com que as autoridades não mais multassem os cidadãos. Como consequência, as infrações voltaram a subir. Em suma, não importa o quanto os três pilares representam, precisam trabalhar equilibrados e integrados.

A inspeção veicular e a reciclagem de veículos, assim como na engenharia de tráfego, surgiram diante de necessidades de preservar e controlar o volume de veículos comercializados, seja para mantê-los em condições originais de rodagem, seja para impedi-los de mantê-los em circulação no caso de falta de segurança.

É fato que as lições aprendidas na engenharia de tráfego acabam sendo negligenciadas na sequência lógica de operacionalização. Temos por hábito legislar e fiscalizar assuntos que impactam diretamente as questões ambientais e de segurança, sem ao menos ter ações voltadas ao pilar educação. Com baixos investimentos, as campanhas digitais inovam na disseminação da informação para explicar as razões da legislação, tanto no apoio à população, como em treinamentos na sua operacionalização.

Atropelar etapas leva a uma interpretação errônea de lei que “pega” e lei que “não pega”, principalmente quando as desigualdades sociais se ampliam. Por exemplo, no Brasil é comum presenciar pessoas atravessando uma determinada rodovia ao lado de uma passarela de pedestres. O pilar engenharia é concretizado, mas nem o pilar fiscalização, muito menos o da educação são aplicados neste caso.

Enquanto a lei da inspeção veicular “não pega”, seja no âmbito da segurança ou no controle das emissões de poluentes, a de reciclagem tem visibilidade inexpressiva, com apenas dois estados atuando. O estado de São Paulo tem legislação com essa finalidade desde 2014 e favorece a legalização das seguradoras que atuam num mercado promissor. O estado de Minas Gerais está começando, mas já mostra infraestrutura e aplicações no pilar educação, com uma parceria entre instituições de ensino e a empresa japonesa Kaiho Sangyo, na cidade de Belo Horizonte.

A junção da inspeção veicular com a reciclagem de veículos cria oportunidade para a terceira modalidade, conhecida como retrofit dos veículos, ou seja, uma atualização que pode estar associada aos controles de poluentes e à segurança do bem. Esta opção poderia ser aplicada inicialmente nos caminhões. Como exemplo, é comum presenciarmos um Mercedes Benz MB1113, do final da década de 1960, em atividade rotineira no transporte de mercadorias e que se beneficiaria dessa possibilidade.

O ponto é que a inspeção, a reciclagem e o retrofit de veículos são complementares e exigem esforços coordenados no sentido de mais uma vez não “queimar” etapas ou avançar uma sem ao menos ter a outra. O medo e receio do poder público de que tais medidas possam ser julgadas impopulares contribuem significativamente para os constantes adiamentos. No caso específico da inspeção ambiental veicular, o Programa de Controle da Poluição do Ar por Veículos Automotores (Proconve) está previsto em marco regulatório desde 1986.

Veículos sem condições de transitar nas vias convivem com cidadãos atravessando a rua fora da faixa de pedestre, combinando fatalidades que geram perdas de vidas e gastos na saúde, e que poderiam ser evitadas com melhor comunicação e sensibilização da população. No âmbito das emissões de poluentes, a mesma coisa acontece. A morte em decorrência da poluição gerada pelos veículos pode ser silenciosa, lenta e gradativa, mas reduz a expectativa de vida e qualidade de vida da população.

A cada dia que se posterga uma ação integrada de inspeção e reciclagem da frota de veículos circulantes, mais se abre margem para que as leis restritivas e benéficas à sociedade se perpetuem em “não pegar”.

Luiz Vicente Figueira de Mello Filho
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