AUTOMOTIVERESTART

A nova ordem do setor automotivo pós Covid-19

Publicado em 17/09/2020

Restart Automotivo depende de decisões sobre o futuro da Mobilidade

Definidos o panorama e os desafios, o AUTOMOTIVERESTART ruma agora para as alternativas tecnológicas

Projeto mais ambicioso da Bright Consulting, o AUTOMOTIVERESTART abordou o impacto da pandemia da Covid-19 nas vendas de veículos leves e se aprofundou nos efeitos que ela causou em toda a cadeia da indústria automobilística, desde o suprimento de componentes à produção dos veículos, e os desafios para a distribuição e comercialização.

A Bright Consulting monitorou a evolução da pandemia nos principais mercados mundiais como Europa, China e EUA. Porém, só conseguiu trazer sua visão sobre a repercussão dela no setor automotivo por contar com o auxílio de mais de 20 especialistas que vivem o dia a dia do setor há mais de 40 anos. Esses profissionais compraram a ideia e deram sua valiosa contribuição sobre os desdobramentos na indústria, seus principais desafios, riscos, oportunidades e consequências para a sociedade brasileira com relação ao futuro da mobilidade no país.

Quando o lockdown foi decretado no final de março e as previsões de economistas, consultorias e organizações globais apontavam para uma catástrofe que aniquilaria economias e milhões de pessoas, as vendas de veículos leves no Brasil, em abril e maio, caíram quase 80%. A restrição da mobilidade a partir de março significou a paralização de fornecedores, montadoras e concessionários, assim como a redução da circulação de veículos, afetando o negócio de usados, serviços de pós-venda, da mobilidade sob demanda e o redirecionamento de grande parte das atividades para o ambiente digital.

Foi um repaginamento extenso do mercado, cujas consequências constituem a nova história que está sendo contada pelo AUTOMOTIVERESTART.

As previsões do início de 2020 para o setor automotivo apontavam para a continuidade da recuperação do mercado, com vendas ao redor de 2,9 milhões de unidades, crescendo para os 3,9 milhões por volta de 2025. Complementada com previsões de exportação à época, elevaria para mais de 85% a utilização da capacidade instalada e aliviaria o peso dos custos fixos incorridos durante a grave crise pela qual passamos de 2014 a 2016.

Aí o mundo ruiu e o grande desafio para o setor tem sido como administrar os impactos de caixa que a pandemia causou, e que só podem ser equalizados no longo prazo, principalmente o excesso de contingente, até que o mercado retorne aos patamares de 2019.

As vendas internas têm mostrado, nos últimos 3 meses, uma recuperação animadora e, em setembro, está caminhando para volumes ao redor de 190 mil unidades, ou 15% abaixo do mesmo mês de 2019. Confirmadas nossas previsões, o 3º trimestre de 2020 ficará 25% abaixo do mesmo período de 2019, fechando o ano ao redor de 1,96 milhão de unidades, queda muito abaixo das previsões catastróficas de 40%.  Se conseguirmos atingir este volume e pelas melhores previsões econômicas do momento, poderemos ter um 2021 melhor e mais estável que os 2,35 milhões previstos no momento.

Mas existem riscos: não chegaremos a este volume se a recuperação da produção for mais lenta por questões trabalhistas ou pelo mix inadequado à demanda por restrição de componentes específicos. Vendemos menos em julho e agosto devido ao estoque reduzido das concessionárias, inclusive com ótimo comportamento no segmento de usados, que bateu 917 mil unidades em agosto e recuperou o ritmo de 2019.

Com relação à segmentação do mercado, os SUV’s são aqui, como em outras partes do mundo, a nova onda e devem atingir este ano 26% do total e evoluir para mais de 31% em 2022. A liderança de mercado em 2020 estará entre VW e GM, com a Fiat correndo por fora. A venda direta deverá ficar no mesmo nível de 2019, com os veículos PcD cobrindo a redução nas vendas a locadoras, principalmente pela momentânea relutância dos consumidores em utilizar serviços de mobilidade sob demanda.

Respostas vieram de todas as esferas e o trabalho remoto é a nova realidade

Com a necessidade de reagir ao terrível momento pelo qual estávamos passando, várias medidas de governos e empresas foram tomadas para buscar diminuir os impactos da disruptura causada pela pandemia – inicialmente para salvaguardar vidas e reduzir o número de vítimas e, na sequência, para manter um mínimo de renda e diminuir o peso de encargos em um momento em que não havia receita. O auxílio emergencial do governo com foco nas pessoas distribuiu renda a milhões de brasileiros e teve um grande impacto na manutenção do consumo e na postergação de financiamentos, impostos e renegociação de contratos de trabalho. Esse programa salvou o emprego de milhões de pessoas.

Com relação à reorganização do trabalho, o que vimos foi a institucionalização do trabalho remoto e o redesenho das operações fabris, que a partir de agosto reiniciaram a produção em jornada reduzida, mas que começam a se ajustar ao ritmo pré pandemia.

A globalização de projetos, ocorrida nos últimos 15 anos, intensificou o volume de trabalho enquanto a racionalização de recursos, somada aos movimentos disruptivos do trinômio conectividade, eletrificação e mobilidade “as a service”, cobrou das fabricantes de veículos o atendimento de demandas diversificadas, para o qual o capital não era disponível.

O que vimos foi a concentração de recursos em zonas de maior impacto como forma de reduzir os custos, desde o desenvolvimento até o sourcing. O Brasil sofreu consistentemente com esta decisão, a ponto de áreas inteiras de desenvolvimento serem desativadas e o conhecimento técnico acumulado por anos ser descartado.

No entanto, a pandemia trouxe questionamentos com relação ao processo de globalização desnudado negativamente quando a falta de componentes se fez sentir. Adicionalmente, no Brasil, os questionamentos ao “global sourcing” se juntaram à desvalorização do real – que atingiu patamares acima de R$5,00 reais por USD – e trouxeram um componente adicional aos já imensos desafios de suprimentos do setor, com uma corrida para a relocalização de componentes, oportunidade única de aumento de escala e redução do gap de competitividade para as autopeças locais.

Apesar disso, a compressão de margens pelo aumento desenfreado de custos (dólar, logística, ociosidade), forçará uma redução de despesas fixas. A realidade é que montadoras, autopeças e a própria rede de distribuição não conseguirão aguardar a recuperação das vendas sem a redução do quadro de funcionários. A força de trabalho do setor, que já passou por um grande ajuste no período 2013/2016, no qual 26 e 58 mil postos de trabalho respectivamente nas montadoras e autopeças foram perdidos, passará por novo solavanco, tanto devido à pandemia quanto pelo aumento da utilização das tecnologias de digitalização e automação de processos. Certamente, a magnitude dos ajustes será menor, pois a recuperação do mercado é iminente, mas algumas dezenas de milhares de empregos estão em risco imediato.

O processo de consolidação de plataformas para maior eficiência e flexibilidade das fábricas continuará acelerado e, para que esta indústria tenha sucesso, a digitalização e automação também. Mais um desafio à frente para a manutenção da força de trabalho.

Menores times induzem a maior carga individual e as empresas buscarão ferramentas para amenizar essa penalidade, com maior flexibilidade para o trabalho remoto e a contratação de equipes autônomas especializadas em problemas específicos – verdadeiros executivos bombeiros especializados em crises.

Não existirá mais tempo para buscar e manipular uma informação ou banco de dados – isso deverá ser apresentado pronto e tratado por empresas também especializadas, para que os executivos tomem as suas decisões. Tudo em linha com as aspirações dos jovens millennials, que desejam pouca profundidade de conhecimento, com muita transversalidade, flexibilidade para novos desafios, “usar” ao invés de “possuir”. Tudo se encaixa – basta se acostumar aos novos tempos.

A institucionalização do e-commerce

O coronavírus trouxe mudanças radicais relacionados à higiene e cuidado com a saúde das pessoas. As plataformas digitais foram fundamentais neste processo.

O AUTOMOTIVERESTART mostrou nesta primeira fase que, no setor automotivo, movimentos cujos efeitos chegariam ao mercado pela evolução natural por maior eficiência foram antecipados do dia para a noite, principalmente no varejo de veículos, devido à necessidade de sobreviver e atender aos clientes num ambiente de lockdown. Negociações completamente digitais do começo ao fim, inclusive via canais sociais, e com foco na captura de leads para conversão se contrapuseram a um menor volume de publicidade off-line.

A melhoria da conexão entre montadoras e seus vários níveis de fornecedores antecipando algumas fases da indústria 4.0 e concessionários com instalações e estoques menores, operando em negócios inexistentes antes da pandemia, como o aluguel de veículos por hora de uso, se sobressaíram. Todas as mudanças trazidas pela Covid-19 amplificaram-se nas redes de distribuição que caminham agora na direção de reduzir o número e a magnitude das concessionárias, pois o cliente está migrando para os canais digitais de comercialização.  Além disso, caiu o volume de negócios, os veículos se tornam cada dia mais confiáveis e inteligentes e terão menor necessidade de serviços no futuro.

As vendas por e-commerce, que eram desejo estratégico antes da Covid-19, agora tornaram-se medidas de sobrevivência. As negociações pela internet dobraram e 85% das pessoas que usaram o canal digital estão satisfeitas.

O Brasil perdeu, em média, uma concessionária de automóveis por dia no primeiro semestre de 2020, ou seja, 187 concessionárias encerraram suas atividades no período.

A internet já é o principal e mais estratégico ‘locus’ da jornada de compras de automóveis e, em breve, tecnologias como a conectividade dos automóveis oferecerão novas oportunidades nesse complexo ecossistema digital.

A sobrevivência da indústria automobilística depende de decisões estratégicas sobre o futuro da mobilidade no Brasil

Passados 6 meses do início da pandemia no país, a prioridade de toda e qualquer indústria é o debate e a busca de soluções para a sobrevivência das organizações, com foco na racionalização.

Durante o período de recuperação da economia e das vendas aos níveis pré crise, a pressão sobre os gestores do setor só aumentará e será estendida ao governo, que é o principal regulador no campo da mobilidade.

A crise de caixa da indústria forçou a revisão das prioridades de gastos e o pedido de adiamento, no Brasil, de prazos do novo marco regulatório relacionados à segurança, emissões e eficiência energética dos veículos. Esse pedido chega em um momento no qual o socorro das matrizes não está disponível, pois estamos todos no mesmo barco.

A indústria automotiva é, em todo o mundo, uma das atividades produtivas mais reguladas. Essa regulação deve-se aos impactos do uso dos veículos automotores no meio ambiente, na segurança das pessoas, no clima, no consumo de energia e, sob esse último aspecto, às questões geopolíticas que definem os combustíveis veiculares, no âmbito da matriz energética de cada país.

A necessidade de regulação é, assim, um perfeito exemplo de lacuna de mercado, um papel inequívoco do Estado, pois deve resultar, em última análise, na integridade e na saúde da população, assim como a contribuição de cada nação ao equilíbrio ambiental e climático do planeta. Essa posição reflete a direção dada pela Constituição Federal que, em seu Artigo 174, dispõe:

“Art. 174. Como agente normativo e regulador da atividade econômica, o Estado exercerá, na forma da lei, as funções de fiscalização, incentivo e planejamento, sendo este determinante para o setor público e indicativo para o setor privado.”

O cumprimento dos requerimentos legais que compõem o arcabouço regulatório costuma ter um custo elevado, com grande peso específico nas atividades de engenharia, pesquisa & desenvolvimento e inovação, além do desenvolvimento de fornecedores. Esse adicional de custo, em condições outrora normais de mercado, é transferido ao preço dos veículos.

Mesmo entendendo o momento singular pelo qual estamos passando, existem muitas implicações negativas da postergação das datas de cumprimento das exigências relacionadas aos limites de emissões veiculares, dos requerimentos de segurança veicular e das metas de eficiência energética, tais como estabelecidas nas Resoluções CONAMA nº 490 e nº 492, ambas de 2018, nas diversas Resoluções do CONTRAN e no Regime Rota 2030 (que contempla também a segurança veicular), respectivamente.

Se, por um lado, acontece expressivo comprometimento a todo um conjunto de medidas, que implicaram e implicarão em planejamento, tomada de decisão e execução físico-financeira, existem, por outro lado, parametrizadas em estudos especializados, informações de estimativas do número de mortes e morbidades causadas pela ausência dos requisitos de segurança veicular e do controle das emissões veiculares de gases poluentes.

Essas mortes e morbidades poderiam ser parcialmente mitigadas e até evitadas, se alternativamente à estrita observância dos cronogramas de implementação das novas fases do PROCONVE (CONAMA), do Road Map  de segurança veicular programado pelo CONTRAN e das metas de eficiência energética preconizadas pelo Rota 2030, fosse implementada a Inspeção Veicular responsável por uma rigorosa e eficaz fiscalização na frota de veículos circulantes, e que por consequência daria origem ao programa de reciclagem de veículos, agente impulsionador das vendas e da manutenção de uma frota de menor risco à sociedade, com geração de empregos e acelerando o caminho na direção da mobilidade limpa pela renovação da frota. Estamos falando, em um médio prazo, na reciclagem de mais de 500 mil veículos por ano e investimentos externos privados na infraestrutura destes serviços.

Ferramentas de monitoramento do conteúdo tecnológico, segurança e de eficiência energética da Bright Consulting apontam que, a partir de janeiro de 2021, mais de 60% dos veículos leves sendo comercializados no Brasil estarão em “compliance” com a legislação de eficiência energética e do grupo A de segurança do Rota 2030 para 2022, inclusive recebendo adequados benefícios, e que parcela similar dos veículos estariam em linha com a fase L7 do Proconve, o que recomenda a empresas e legisladores uma decisão equilibrada referente a custos e benefícios relacionados a postergações regulatórias.

É importante deixar claro que o que está em jogo aqui é qual o tipo de mobilidade o País deseja ter no futuro para salvaguardar suas competências e o futuro da indústria automobilística no Brasil, decisão estratégica de responsabilidade do governo.

Porém, mais grave que o problema de caixa das fabricantes – e de toda a cadeia que orbita em torno delas – são as sequelas que a pandemia pode deixar para o setor automobilístico brasileiro. A indústria local corre grande e real risco de desaparecer, em consequência de um movimento que foi acelerado pela pandemia: a eletrificação das frotas de veículos leves nos maiores mercados mundiais que têm enorme capacidade financeira de subsidiar a venda destes veículos.

E que fique bem claro que não somos contra o carro elétrico.

Nesse momento, o Brasil não necessita e nem tem condições de realizar uma mudança radical de plataforma tecnológica. O país tem muito mais a ganhar se realizar a migração dos motores de combustão interna para a hibridização combinada com etanol até a futura bioeletrificação via célula de combustível e energia renovável.

Soluções existem, mas dependem de ser conduzidas pelo governo, que é o principal regulador no campo da mobilidade em qualquer parte do planeta. Sem tratar a questão de maneira estratégica, o Brasil não passará de mero passageiro no processo de redefinição do futuro do mercado e da indústria automobilística no país.

Para podermos decidir sobre a sustentabilidade da indústria automobilística no Brasil AUTOMOTIVERESTART tratará a partir da próxima semana da sustentabilidade da mobilidade e da rota tecnológica a ser seguida no futuro.

Paulo Cardamone | Cassio Pagliarini

Bright Consulting

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