A ELETRIFICAÇÃO DE FROTAS DE TRANSPORTE LOGÍSTICO E DE PASSAGEIROS

Mobilidade Sustentável

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Ao contrário do mercado de automóveis, o mercado de veículos comerciais eletrificados enfrenta dilemas técnicos ainda não solucionados

Por Cassio Pagliarini

As vendas de eletrificados entre os veículos leves tiveram um crescimento recente bastante vigoroso, passando de 47 mil unidades em 2022 para 92 mil unidades em 2023, equivalente a 4,3% das vendas do ano passado, de acordo com o projeto E-Mobility Scenarios 2030 da Bright Consulting. Essa participação sobe a 7,3% no acumulado de 2024, antevendo que o volume de eletrificados seja superior ao dobro do realizado em 2023 – algo como 205 mil unidades. Esse crescimento é o resultado do amadurecimento e reconhecimento das tecnologias disponíveis, do investimento de grandes marcas chinesas especialistas no mercado brasileiro e – fundamental – no barateamento dos veículos ofertados.

Quando observamos os veículos comerciais, o panorama é bem diferente. Os números da Bright Consulting mostram que, durante 2022, várias empresas buscaram alternativas eletrificadas para o transporte de mercadorias, com 933 veículos comerciais de pequeno porte (até 3,5 toneladas) e 714 caminhões elétricos vendidos, num mercado total de 127 mil pesados (0,56% de participação). Em 2023, esses números caíram para 604 comerciais leves e 238 caminhões num mercado de 108 mil pesados ou 0,22% de participação. Em 2024, a participação de caminhões eletrificados voltou a subir, com 0,57% nas vendas até abril.

Quais as possíveis explicações para esse comportamento? São múltiplas as respostas: investimento bem maior (de 180 a 270%) do veículo equivalente a diesel, tempo demasiado – 5 anos – para permitir a amortização desse investimento maior, insegurança com o valor residual do veículo e com a durabilidade das baterias, necessidade de rotinas operacionais específicas para incluir o carregamento e, finalmente, o investimento nas estações de recarga. Ou seja, a transição para a mobilidade sustentável custa caro!

Os números registrados acima são basicamente de aplicações de distribuição urbana de carga, com quilometragem diária limitada: entrega de bebidas, lojas de varejo, compras pela internet são bons exemplos. Os veículos comerciais a bateria cumprem com louvor essa tarefa mas, por enquanto, ainda são caros. A insegurança com sua compra faz com que os operadores busquem opções de locação, que adicionam novos custos à equação e tornem a transição ainda mais difícil.

Para trajetos de médio e longo percurso, a equação não se sustenta com veículos elétricos puros e outras rotas tecnológicas serão necessárias: gás natural, hidrogênio ou combustível sintético gerado a partir de fontes limpas. Para explicar melhor a razão pela dificuldade de operação, vamos comparar com um avião de longo percurso: cada tonelada de querosene carrega 30 vezes mais energia do que uma tonelada de baterias de lítio e, à medida que a viagem prossegue, o querosene vai diminuindo nos tanques, reduzindo o peso da aeronave. Se fosse movido a baterias, esse peso permaneceria durante todo o trajeto. O mesmo raciocínio pode ser aplicado ao transporte rodoviário de longa distância, no qual as baterias ocupam uma parte considerável da capacidade máxima de tração da composição rodoviária.

Se, por um lado, os produtos devem percorrer uma rota de aperfeiçoamento até se tornarem economicamente viáveis, por outro lado devem surgir efeitos impulsionadores para essa transição. A primeira delas vem com a necessidade de as empresas trilharem uma cultura ESG em função de seus compromissos de negócios e da imagem desejada junto aos seus clientes. Essas empresas devem buscar soluções logísticas que atendam as metas ESG, o que passa por um transporte mais sustentável, mesmo que marginalmente mais caro. Outro efeito impulsionador é a regulação. Embora os programas Inovar-Auto, Rota 2030 e Mover estejam sendo eficazes em promover maior eficiência energética nos veículos leves, não existe legislação sobre o assunto para caminhões e ônibus. Este é um assunto de maior complexidade e ainda sem metodologia definida para sua avaliação, algo bastante urgente num país como o Brasil, tão dependente de caminhões de longo percurso.

Falando em ônibus, temos outros complicadores. O transporte urbano de passageiros pode rumar para a eletrificação pura pelos mesmos motivos empregados na distribuição urbana de carga: trajetos diários limitados e muitas paradas, rotina perfeita para um ônibus elétrico a baterias. Porém, os ônibus elétricos custam 2,5 a 2,8 vezes o preço de seus equivalentes a diesel. As empresas operadoras estão descapitalizadas pela pequena circulação de passageiros durante a pandemia, dificultando a troca de veículos a combustão pelos elétricos, tanto que solicitaram a extensão dos períodos de utilização de cada veículo. A cidade de São Paulo publicou legislação para a substituição da frota, mas terá que arcar com financiamentos subsidiados para a compra dos veículos e instalação das centrais de recarga nas bases de operação.

O volume de ônibus elétricos colocados em circulação tem servido apenas para experimentação e avaliação de custos e rotinas: 20 unidades em 2021, 35 em 2022 e 31 em 2023. A verdadeira transição ainda não se iniciou e precisará de muito capital dentro de um país que precisa investir em várias frentes: educação, saúde, saneamento, segurança e agora a recuperação da catástrofe no Rio Grande do Sul. Além disso, a viabilização de uma transição para a cidade de São Paulo não garante a viabilização da mobilidade elétrica para cidades menores, que promovem a segunda vida dos ônibus que saem de circulação em São Paulo.

As soluções de engenharia são bem mais fáceis de resolver do que as equações financeiras para se adotar a mobilidade sustentável entre os pesados. O projeto E-Mobility Scenarios 2030 da Bright Consulting faz a descrição das alternativas disponíveis e traça o impacto nos vários segmentos do mercado, desvendando o futuro mais provável e contribuindo para decisões robustas das empresas operadoras.

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