A cada mês o número de emplacamentos de motocicletas supera os dos veículos leves não comerciais. Inúmeras combinações de propulsores mais sustentáveis estão em pauta agora e para o futuro entre os automóveis. Enquanto isso, as motocicletas caminham silenciosamente no protagonismo individual da mobilidade brasileira.
Observadas sob uma perspectiva nacional, as condições socioeconômicas têm contribuído significativamente para esta condição. Os veículos leves têm se sofisticado pelo aparato tecnológico, seja em conteúdo instalado, seja pela preferência segmentada do brasileiro aos SUVs. Por outro lado, as motocicletas de entrada têm se mantido com valores atrativos reajustados ao longo dos anos. Três fatores contribuem para esta mudança:
- Mobilidade para ir e vir do trabalho, que volta gradativamente a ser presencial pós-pandemia, onde o tráfego nos grandes centros desestimula o uso do automóvel pelo custo e tempo de deslocamento associado a precariedade do transporte público;
- O uso para os serviços de entregas por aplicativo, seja para a alimentação ou produtos pontuais de entrega rápida;
- E o lazer nos finais de semana, motocicletas mais sofisticadas pelo design e motorização convencional abocanham a menor parcela nas vendas das duas rodas.
Recentemente, uma nova modalidade, descoberta nas cidades menores, está aos poucos se consolidando nos grandes centros urbanos: o serviço de aplicativo para o transporte individual de passageiros. O trajeto para qualquer lugar nas pequenas cidades do Nordeste ao valor de R$1,00 (um real) no início do século XXI transformou-se hoje na uberização da motocicleta.
Por mais que haja uma interferência municipal em coibir esta modalidade de transporte privado individual, como ocorre na cidade de São Paulo, esta proibição acaba tornando-se inconstitucional diante da legislação vigente, atividade regulamentada pela Lei Federal 13.640/2018 e prevista na Política Nacional de Mobilidade Urbana (Lei Federal 12.587/2012).
Dados da Abraciclo (Associação Brasileira dos Fabricantes de Motocicletas, Ciclomotores, Motonetas, Bicicletas e Similares) estimam que, em 2023, a frota de motocicletas ultrapassou 33 milhões de unidades no país, comprovando que milhões de pessoas se deslocam todos os dias utilizando as motocicletas próprias ou de terceiros, pilotando-as ou como passageiros.
No outro lado da moeda temos as consequências: batemos recordes a cada mês com o número de acidentes envolvendo os motociclistas, reduzindo o número de trabalhadores ativos por afastamentos, por sequelas ou por óbitos e aumentando significativamente os valores direcionados à saúde pública para tratar o efeito deste crescimento silencioso. Só na cidade de São Paulo, foram mais de 100 óbitos nos primeiros três meses de 2024 e a tendência é o agravamento, caso não haja nenhuma ação de conscientização e fiscalização para estancar esta triste estatística.
Não podemos fechar os olhos para as necessidades dos motociclistas, que criticamos muitas vezes nas vias urbanas, mas ficamos surpresos com os prazos de entregas para eventuais soluções. O que precisamos é entender que o país terá mais motocicletas que veículos leves circulando nas cidades e que seus usuários devem ser ouvidos e não marginalizados pela sociedade.
Luiz Vicente F. de Mello
Consultor de inspeção veicular Bright Consulting